Estabilidade e segurança são dois termos importantes para, praticamente, qualquer segmento da Engenharia. Contudo, boa parte desses atributos está diretamente relacionada ao comportamento do solo e/ou rochas que são avaliados, principalmente, pela Geotecnia.
Esse é um mercado que está em constante expansão e, hoje, é possível dizer que é uma das áreas mais atrativas para os que atuam na elaboração de barragens, pilhas, rodovias, aterros sanitários, infraestrutura, dentre outros.
Nesse sentido, é importante direcionar um olhar aprofundado para esses profissionais, inclusive para a atuação das mulheres na Geotecnia. E, para falar sobre o tema, entrevistamos Lilian Maier Swinka, Engenheira Civil e especialista em instrumentação geotécnica, e Rafaela Baldí, consultora de Engenharia Civil e Geotecnia. Confira!
Afinal, como é o mercado de Geotecnia?
A Geotecnia é uma das cadeiras básicas da Engenharia Civil, porém, geólogos e engenheiros de minas também apresentam competências para atuação na área. Em geral, esses profissionais se voltam ao estudo da mecânica dos solos e das rochas, podendo trabalhar em áreas como:
- Mineração, atuando em barragens, em especial voltadas à disposição de resíduos;
- Engenharia Urbana, com foco em estabilidade de taludes, pavimentos, obras de fundações, de infraestrutura, divisões sociais de modo geral, entre outros;
- Geotecnia Ambiental, que é uma área bastante ampla e que, inclusive, agrega algumas das áreas citadas.
Segundo Lilian, na prática, a área é bastante abrangente. Os especialistas podem atuar tanto na área de projetos e consultoria, quanto no acompanhamento e fiscalização de obras, mapeamentos e investigações geotécnicas de campo, instrumentação e monitoramento in-situ, dentre outras atividades antes consideradas “masculinas”.
De acordo com Rafaela, alguns dos mercados em que os profissionais de Geotecnia podem ser inseridos incluem operações de infraestrutura, mineração e energia. Entretanto, por ter muito conhecimento de processos e tecnologia, o geotécnico também tem uma inclusão facilitada na gestão de projetos.
Quais são os desafios da mulher na Engenharia e na Geotecnia?
Mesmo com a amplitude da área, é inegável que algumas mulheres na Engenharia e na Geotecnia passam por diversos desafios. Os salários desiguais, a suposição de serem menos capazes do que os homens e os temores infundados acerca de afastamentos e licenças em caso de gravidez, por exemplo, são alguns deles.
Segundo dados do Ministério do Trabalho, a absorção de engenheiras no setor de construção chegou a 50% nos últimos 10 anos. Em termos de mão de obra, apenas 10% estão presentes nesse setor.
Ambiente educacional
Conforme Rafaela aponta, os obstáculos podem começar já no ambiente acadêmico. Muitas mulheres que desejam ir a campo, por exemplo, para iniciar o contato com a parte prática da área, são preteridas por estudantes masculinos.
Lilian conta que a área de Geotecnia pode ser melhor divulgada e difundida no meio acadêmico para que mais mulheres possam atuar nessa área tão abrangente. “Tive oportunidade de fazer estágio em lugares em que eu pude atuar tanto em campo como em escritório e isso me ajudou muito quando comecei a minha vida profissional como Engenheira Civil”, comenta. Já Rafaela foi a única mulher de sua sala de aula a encarar o desafio das obras em outros estados.
Diferença salarial
Em uma realidade em que as engenheiras recebem o equivalente a 82,1% do salário dos homens, é esperado que as mulheres também sejam afetadas na Geotecnia.
Lilian comenta que a diferença entre os salários médios das mulheres e dos homens na engenharia tem reduzido, mas ainda é significativa. Isso tende a melhorar com a visão de futuro das empresas, que é mais responsável e inclusiva. O mercado precisa atrair mulheres talentosas e habilidosas, mantê-las e capitalizar seus pontos fortes e reconhecer o valor que podem agregar.
Reconhecimento das competências
Por fim, Rafaela apresenta a visão de que o processo de recepção das mulheres no mercado de trabalho de Geotecnia tende a passar por três fases. Na primeira, há um estranhamento, no qual as competências são colocadas em prova. Em seguida, os pequenos “testes”, que vão se diluindo com a evolução dos projetos e das obras — em que a geotécnica se posiciona como especialista no assunto. E, por fim, há a aceitação.
Ela complementa, ainda, que é importante não se “acanhar”. Estar preparada é importante, visto que é esperado que haja um desafio maior em função da preconcepção de que as geotécnicas podem ser menos capacitadas do que os homens.
De que maneira as mulheres podem se destacar na Geotecnia?
Hoje, Rafaela vive na Dinamarca. Ela conta que, no país, há a preferência por profissionais mulheres, mesmo em áreas, historicamente, mais ocupadas por homens. Entretanto, uma vez que essa não é uma realidade no Brasil, é interessante conferir algumas sugestões para se destacar.
Ao considerar que, apesar das melhorias ao longo dos anos, ainda existem disparidades, Lilian e Rafaela trazem algumas sugestões. Elas suportam, em especial, estudantes que estão entrando no mercado e desejam seguir na Geotecnia.
Ocupação de espaços
Em primeiro lugar, é preciso reconhecer a abertura de espaços para as mulheres na Geotecnia — e aproveitá-los. Conforme Rafaela aponta, esse movimento vem das próprias profissionais. Ela percebe, por exemplo, que suas alunas estão demonstrando uma maior resistência às disparidades de gênero do mercado, exigindo seu espaço com maior firmeza e determinação.
Aproveitamento dos espaços no mercado
Em complemento, Lilian compartilha a percepção do próprio mercado em reconhecer cada vez mais a força das mulheres. Ela conta, inclusive, que a empresa em que trabalha sempre abriu oportunidades para a contratação de mulheres, tanto para atividades de escritório como nas obras.
“Quando entrei na empresa, a preferência era para a contratação de uma mulher para atuar em campo, com a justificativa de que uma companhia concorrente estava conquistando melhores resultados por meio das especialistas de sua equipe”, relata.
Posicionamento
Por fim, Rafaela compartilha o que acredita ser um dos principais segredos para se destacar: posicionamento. “É importante traçar metas, assumir a postura profissional que nos é de direito e não ter receio de ser julgada ou questionada”, comenta. Afinal, quando uma geotécnica ou engenheira é competente, a tendência é que ela seja vista como tal.
Conhecimento do próprio potencial
Lilian finaliza dizendo que, inevitavelmente, alguns problemas de gênero podem ocorrer no dia a dia, em vista da realidade do mercado. Contudo, ao exigir seus direitos constitucionais e conhecer seu potencial, é possível trilhar um caminho mais fácil em meio às adversidades.
Por fim, ao falarem de forma geral sobre a área, foi reforçada a necessidade de estimular o uso da Geotecnia de maneira preditiva e sustentável. Para isso, é preciso de valorização dos profissionais, de modo que tenham espaço para atuar antes dos problemas ocorrerem, e não depois.
As entrevistadas reforçaram a relevância do bom convívio com os recursos naturais, buscando priorizar, por exemplo, o uso de energias renováveis, como a energia eólica. Isso faz diferença para todos, afinal, o mercado espera por um futuro mais seguro e sustentável para todos.
As mulheres na Geotecnia ainda têm alguns obstáculos a superar, mas já é possível perceber grandes avanços na área. Por meio dos estímulos certos e da abertura de espaços constantes para que demonstrem seu potencial, a tendência é que o mercado passe a reconhecer, nas devidas proporções, a força dessas profissionais. Afinal, elas são tão imprescindíveis quanto seus colegas para a segurança e a estabilidade de construções de todos os portes.
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